Tempo favorável, dias de salvação
“Não percamos um tempo tão precioso para chorar os nossos pecados, as nossas infidelidades e a nossa não correspondência, para assim obtermos a divina misericórdia.” (São João Calábria)
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25.02.2023 08:10:00 | 8 minutos de leitura
No período da Quaresma, iniciado com a Quarta-feira de Cinzas, a Palavra de Deus e a Igreja nos convidam a uma séria revisão da nossa vida, desejando acima de tudo a santificação. Temos um caminho seguro sobretudo mostrado no Evangelho proclamado na Missa da imposição das Cinzas: Mt 6,1-6.16-18. Vamos trazer os três elementos apresentados por Jesus, alguns pensamentos de São João Calábria e outros santos com o único objetivo de nos ajudar a entender e viver melhor esse tempo.
O Evangelho inicia com o alerta: “Disse Jesus aos seus discípulos: ‘Ficai atentos para não praticar a vossa justiça na frente dos homens, só para serdes vistos por eles’” (Mt 6,1). Fazer práticas de piedade ou alguma obra de caridade para ser elogiado pelos outros não agrada a Deus. Por isso, ninguém precisa saber dos seus propósitos pessoais, a não ser o Diretor Espiritual. Importante é que cada um de nós, iluminados pela Palavra de Deus e em profundo discernimento possamos fazer nosso caminho de identificação com o Senhor.
O Senhor não pede muito de nós. Na liturgia da Quarta-feira de Cinzas o Evangelho nos traz três elementos centrais: esmola, oração, jejum. Aliás, neste dia e na Sexta-feira Santa todos os Católicos têm o dever de observar o jejum e a abstinência, que pode ser observado também em outras ocasiões. Jesus deixa bem claro como devem ser observadas essas práticas. Sem exageros, fingimentos ou buscando elogios públicos. Vamos aos respectivos trechos do Evangelho: “Quando deres esmola, não toques a trombeta diante de ti (v. 2); Quando orardes, não sejais como os hipócritas, que gostam de rezar em pé, nas sinagogas e nas esquinas das praças, para serem vistos pelos homens (v. 5); Quando jejuardes, não fiqueis com o rosto triste como os hipócritas. Eles desfiguram o rosto, para que os homens vejam que estão jejuando (v. 16)”. Porque, quando fazemos buscando reconhecimento, “eles já receberam a sua recompensa” diz o Senhor.
Essas e todas as outras práticas de piedade devem servir primeiramente para nossa santificação. São, poderíamos assim dizer, uma combinação entre você e Deus, ou melhor, uma iluminação do Espírito Santo para nossa salvação. Elas nos ajudam na nossa conversão e santificação. São ações feitas por amor a Deus e para superarmos nossas limitações e fraquezas. A Igreja acredita que tendo domínio sobre nossos desejos e vontades carnais, teremos maior avanço espiritual.
Falando sobre esmola, a Igreja orienta que “as obras de misericórdia são as ações caritativas pelas quais socorremos o próximo em suas necessidades corporais e espirituais. Instruir, aconselhar, consolar, confortar são obras de misericórdia espiritual, como também perdoar e suportar com paciência. As obras de misericórdia corporal consistem sobretudo em dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede, dar moradia aos desabrigados, vestir os maltrapilhos, visitar os doentes e prisioneiros, sepultar os mortos. Dentre esses gestos de misericórdia, a esmola dada aos pobres é um dos principais testemunhos da caridade fraterna. E também uma prática de justiça que agrada a Deus.” (Catecismo da Igreja Católica, n. 2447).
A oração, feita com muito amor e zelo tem o objetivo de nos sintonizar com Deus. Só estando em comunhão com Ele poderemos saber o que Deus quer de nós e como devemos viver. Quando a Igreja convida a intensificarmos nossa vida espiritual, ela deseja que o nosso coração seja cada dia mais semelhante ao de Jesus, servo obediente ao Pai. Como lemos em Filipenses 2,5: “Tende em nós os mesmos sentimentos de Cristo!” Rezamos a jaculatória: “Jesus Manso e Humilde de Coração, fazei o nosso coração semelhante ao Vosso”. Esse é o propósito e a meta da oração. Por isso, a verdadeira oração deve nos levar a uma vida de santificação.
A Igreja nos ensina que “o quarto preceito (‘Guardar abstinência e jejuar nos dias determinados pela Igreja’) [Mandamentos da Igreja] assegura os dias de ascese e de penitência que nos preparam para as festas litúrgicas e contribuem para nos fazer adquirir domínio sobre os nossos instintos e a liberdade do coração” (CEC, n. 2043).
São Paulo VI reconhecia a necessidade de colocar o jejum no contexto da chamada de cada cristão a “não viver mais para si mesmo, mas para aquele que o amou e se entregou a si por ele, e [...] também a viver pelos irmãos” (Cf. Cap. I da Constituição Apostólica Paenitemini de 1966).
São João Calábria escreveu em várias circunstâncias sobre a Quaresma:
“Meus amados irmãos.
A santa Quaresma é um tempo de séria meditação para todos os cristãos, mas para nós, Pobres Servos da Divina Providência, esse tempo deve ter uma importância toda especial, deve ser um forte e potente apelo a olhar sobre nós mesmos, a fim de que vejamos e estudemos para saber como estamos a respeito da nossa santificação pessoal e a da Obra, à qual temos a grande graça de pertencer. Porque, meus queridos, como outras vezes lhes disse, a nossa santificação, o nosso progresso espiritual, a nossa virtude é a alma, a vida da Obra dos Pobres Servos da Divina Providência. Se nós não vivermos segundo a nossa especial vocação, decretaremos a morte das nossas almas e a desta Obra. Meu Deus, que grande responsabilidade!”
Em outra ocasião, disse: “Não percamos um tempo tão precioso para chorar os nossos pecados, as nossas infidelidades e a nossa não correspondência, para assim obtermos a divina misericórdia.”
E ainda: “Conservemos zelosamente nós, por enquanto, esses ensinamentos, e façamos também santos propósitos que nos ajudarão a santificar a santa Quaresma, tempo particularmente favorável, dias de salvação para nós e para muitos nossos irmãos. Tempo verdadeiramente favorável, dias de salvação.”
São Leão Magno, falando sobre a purificação espiritual por meio do jejum e da misericórdia, escreveu:
“Em todo tempo, amados filhos, a terra está repleta da misericórdia do Senhor (Sl 32,5). [...]
O retorno, porém, desses dias que os mistérios da salvação humana marcaram de modo mais especial e que precedem imediatamente a festa da Páscoa, exige que nos preparemos com maior cuidado por meio de uma purificação espiritual.
Na verdade, é próprio da solenidade pascal que a Igreja inteira se alegre com o perdão dos pecados. Não é apenas nos que renascem pelo santo batismo que ele se realiza, mas também naqueles que desde há muito são contados entre os filhos adotivos.
É, sem dúvida, o banho da regeneração que nos torna criaturas novas; mas todos têm necessidade de se renovar a cada dia para evitarmos a ferrugem inerente à nossa condição mortal, e não há ninguém que não deva se esforçar para progredir no caminho da perfeição; por isso, todos sem exceção, devemos empenhar-nos para que, no dia da redenção, pessoa alguma seja ainda encontrada nos vícios do passado.
Por conseguinte, amados filhos, aquilo que cada cristão deve praticar em todo tempo, deve praticá-lo agora com maior zelo e piedade, para cumprir a prescrição, que remonta aos apóstolos, de jejuar quarenta dias, não somente reduzindo os alimentos, mas sobretudo abstendo-se do pecado.
A estes santos e razoáveis jejuns, nada virá juntar-se com maior proveito do que as esmolas. Sob o nome de obras de misericórdia, incluem-se muitas e louváveis ações de bondade; graças a elas, todos os fiéis podem manifestar igualmente os seus sentimentos, por mais diversos que sejam os recursos de cada um.
Se verdadeiramente amamos a Deus e ao próximo, nenhum obstáculo impedirá nossa boa vontade. Quando os anjos cantaram: Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade (Lc 2,14), proclamavam bem-aventurado, não só pela virtude da benevolência, mas também pelo dom da paz, todo aquele que, por amor, se compadece do sofrimento alheio.
São inúmeras as obras de misericórdia, o que permite aos verdadeiros cristãos tomar parte na distribuição de esmolas, sejam eles ricos, possuidores de grandes bens, ou pobres, sem muitos recursos. Apesar de nem todos poderem ser iguais na possibilidade de dar, todos podem sê-lo na boa vontade que manifestam”.
Assim desejamos que todos possamos viver este tempo favorável que o Senhor nos concede aproveitando-nos dos benefícios concedidos por Deus aos que o buscam de coração sincero, purificando-se dos seus desejos para viver na santidade.
Abençoado caminho quaresmal para todos nós!
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